1ª sessão

Filhos da Noite

 

Pelos meus lábios fala a tempestade,
Do que não é sentido eu sou a sensação!…
Dos olhos dum profeta eu sou a claridade
Sou o murmúrio da Revelação !
Eu sou a tua alma, ó Hamlet sombrio,
esse espectro terrível que tu viste…
Fui eu que meditei sobre um crânio vazio.
Na trágica visão de tudo quanto é triste!
Enigmático duque, ó pálido Manfredo,
Eu fui da tua alma os tristes cataclismos!
Pus nos teus olhos uma fada e um arvoredo.
Contigo desejei lançar-me nos abismos!
Sou o luar do Desmaio, o clarão da Vertigem,
Só eu produzo o verdadeiro dia!
Sou a alma do Imprevisto,
o segredo da Origem,
Sou um caos. Senhor, todo harmonia!…
Sou o génio da Luz eterno e poderoso.
Ainda ignoto, ainda incompreendido…
Vivo nos corações oculto, misterioso.
Como a sombra da Noite e do Desconhecido!… 

Teixeira de Pascoaes

Visões e premonições

«Na noite de quarta para quinta-feira depois de Pentecostes (7-8 de Junho de 1525), vi em sonhos o que representei neste esboço: uma multitude de trombas de água caindo do céu. A primeira atingiu a terra a uma distância de quatro léguas: o abalo e o ruído foram aterradores e toda a região ficou inundada. Fiquei tão impressionado que acordei. Depois as outras trombas de água, assustadoras em violência e em número, atingiram a terra, umas mais longe, outras mais perto. Caíam de tão alto que pareciam descer lentamente, mas, quando a primeira tromba se aproximou da terra, a sua queda tornou-se tão rápida e acompanhada de um tal barulho e vendaval que acordei todo a tremer e levei muito tempo a recompor-me. Assim que me levantei pintei o que aqui se vê. Deus encaminha tudo pelo melhor.»
Albrecht Durer

Marguerite Yourcenar, O tempo esse grande escultor, tradução de Helena Vaz da Silva, Difel, Lisboa,2006

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